O
autor propõe a presente ação ordinária, com pedido de tutela
antecipada, em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando, em síntese, que a ré
proceda ao reajuste do seu subsídio mensal em folha de pagamento.
Como
causa de pedir sustenta a ocorrência de omissão inconstitucional, posto
que o art. 37, X, da Constituição da República impõe a regra da revisão
anual. Destarte, pugna pela revisão da sua remuneração através da
variação do INPC no período, num percentual de 21,17%, com a consequente
criação de rubrica e a expedição de ofício para que o Órgão Pagador
cumpra a liminar.
A inicial, fls. 01/26, veio acompanhada com procuração, fl. 29, e pelos documentos anexos, fls. 27/28 e 30/49.
Decisão
de fl. 58 afastando a ocorrência de litispendência ou coisa julgada,
diante da certidão de fl. 56/57, bem como indeferindo o pedido de
gratuidade de justiça.
Substabelecimento acostado aos autos, fl. 61.
Custas devidamente recolhidas, fl. 65.
É o relatório. Decido.
I – DOS FATOS E DO DIREITO
A
parte autora busca, em sede de tutela antecipada, que seja reconhecida a
omissão inconstitucional presente no art. 37, X, da Constituição da
República, ensejando, assim, o reajuste do seu subsídio mensal em folha
de pagamento com a revisão da sua remuneração através da variação do
INPC no período, num percentual de 21,17%. Por fim, pugna pela criação
de rubrica e a expedição de ofício para que o Órgão Pagador cumpra a
liminar.
Dispõe a Constituição da República em seu art. 37, X, o seguinte:
Art.
37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
X
- a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o §
4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei
específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada
revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Regulamentando a revisão geral e anual em comento, a Lei n° 10.331, de 2001, aduz em seus artigos 1º e 2º:
Art. 1º As
remunerações e os subsídios dos servidores públicos dos Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário da União, das autarquias e fundações
públicas federais, serão revistos, na forma do inciso X do art. 37 da Constituição, no mês de janeiro, sem distinção de índices, extensivos aos proventos da inatividade e às pensões.
Art. 2º A revisão geral anual de que trata o art. 1º observará as seguintes condições:
I - autorização na lei de diretrizes orçamentárias;
II - definição do índice em lei específica;
III - previsão do montante da respectiva despesa e correspondentes fontes de custeio na lei orçamentária anual;
IV
- comprovação da disponibilidade financeira que configure capacidade de
pagamento pelo governo, preservados os compromissos relativos a
investimentos e despesas continuadas nas áreas prioritárias de interesse
econômico e social;
V - compatibilidade com a evolução nominal e real das remunerações no mercado de trabalho; e
Com
a mudança perpetrada pela EC 19/98, a regra supramencionada
expressamente previu o princípio da periodicidade, ou seja, garantiu
anualmente ao funcionalismo público, no mínimo, uma revisão geral.
Diante
da nova redação, o STF decidiu em sede de Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão (2.061-DF, DJ 29 Jun. 2001, Rel. Min.
Ilmar Galvão) tratar-se de “norma
constitucional que impõe ao Presidente da República o dever de
desencadear o processo de elaboração da lei anual de revisão geral da
remuneração dos servidores da União, prevista no dispositivo
constitucional em destaque, na qualidade de titular exclusivo da
competência para iniciativa da espécie, na forma prevista no art. 61,
§1, II, a, da CF”. Neste julgamento, o STF reconheceu a mora do Presidente em iniciar o processo legislativo.
Em suma, para
que regra presente no inciso X do art. 37 tenha eficácia mister o envio
pelo Presidente da República de, pelo menos, um projeto de lei anual,
tratando da reposição do poder aquisitivo da remuneração dos servidores
públicos federais, observados os tetos constitucionais.
No
caso vertente, consoante os documentos presentes nos autos, verifica-se
que, de fato, o autor é Agente da Polícia Federal 1ª Classe, lotado em
exercício na Delegacia de Repressão a Entorpecentes.
Sustenta
o autor que os servidores públicos da Polícia Federal estão há quatro
anos recebendo as mesmas remunerações. No caso específico do autor, o
mesmo recebe a remuneração de R$ 9.468,92 desde fevereiro de 2011,
quando atingiu a primeira classe, conforme documentos anexos às fl.
42/48, não havendo revisão no salário da categoria desde 2009.
Configurada, portanto, a omissão inconstitucional do Poder Executivo, já que solapa a eficácia do art. 37, X.
Cumpre
mencionar que a declaração de inconstitucionalidade exercida em sede de
controle difuso por via incidental somente pode ser admitida quando for
questão prejudicial ou necessária à análise da ação. Em outras
palavras, há que se reconhecer a adequação da via utilizada já que o
requisito da lesividade está implícito na própria ilegalidade ou
inconstitucionalidade da norma, seja por ação ou por omissão. Não há que
se cogitar sobre a existência de sentença extra ou ultra petita,
posto que a inconstitucionalidade de leis é questão de ordem pública,
podendo ser declarada de ofício pelo magistrado em qualquer momento ou
grau de jurisdição. Neste sentido:
EMBARGOS
À EXECUÇÃO FISCAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE OFÍCIO.
POSSIBILIDADE. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA E TAXA DE COLETA DE LIXO E
LIMPEZA PÚBLICA. SERVIÇOS PÚBLICOS INESPECÍFICOS E INDIVISÍVEIS.
MUNICÍPIO DE NITERÓI. 1- A inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder
Público pode ser reconhecida em qualquer procedimento judicial de modo
incidente, negando-se aplicação ao dispositivo apontado como
inconstitucional. 2- O processo de fiscalização das normas jurídicas é
atividade típica do Poder Judiciário. Uma norma em desconformidade
material, formal ou procedimental com a Carta Magna não pode prevalecer,
devendo o julgador, antes de adentrar ao mérito da causa, examinar a
sua validade. 3- Não se pode exigir a taxa de coleta de lixo e de
limpeza pública, por configurar serviço público universal e indivisível.
Precedentes do STF. 4- Apelação improvida. (TRF-2 - AC: 337746 RJ
2001.51.02.006311-0, Relator: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES,
Data de Julgamento: 26/02/2008, QUARTA TURMA ESPECIALIZADA, Data de
Publicação: DJU - Data:16/04/2008 - Página:348/349)
Tal
como no caso de inconstitucionalidade por ação, também a omissão
violadora da Constituição pode ser imputável aos três Poderes. Por
exemplo, pode o Poder Executivo se abster de tomar medidas
político-administrativas em matéria de educação (art. 208 da
Constituição).
Reconhecida
a omissão inconstitucional, não há que se falar em violação do art. 2º
da Constituição, pois que é da essência do princípio da tripartição de
poderes, já que independentes e harmônicos entre si, o controle
recíproco de suas prerrogativas, de modo que, na atuação deficiente de
um deles, como no caso em que a Constituição impõe a deflagração anual
do processo legislativo para revisão geral dos vencimentos e subsídios,
deve ser restabelecido o traçado constitucional, com o consequente
reconhecimento do direito constitucionalmente previsto.
Ademais, tal crítica cai por terra quando analisamos a própria teoria democrática. Se considerarmos que a Constituição resguarda
direitos fundamentais, e cabe ao Judiciário a sua guarda, cabe também a
ele o dever de concretizá-los, sobretudo quando há inércia do Executivo
e do Legislativo.
Ressalta o Min. Celso de Mello, na relatoria do Mandado de Injunção nº 542, Dj: 28/06/2002:
“Se
o Estado, no entanto, deixar de adotar as medidas necessárias à
realização concreta dos preceitos da Constituição, abstendo-se, em
conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a própria Carta
Política lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto
constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão,
que pode ser total (quando é nenhuma a providência adotada) ou parcial
(quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público).
Entendimento prevalecente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
RTJ 162/877-879, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Pleno). -
A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor
extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se
como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis
que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição,
também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência
(ou insuficiência) de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade
dos postulados e princípios da Lei Fundamental.
DESCUMPRIMENTO DE IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL LEGIFERANTE E
DESVALORIZAÇÃO FUNCIONAL DA CONSTITUIÇÃO ESCRITA. - O Poder Público -
quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de legislar,
imposto em cláusula constitucional, de caráter mandatório - infringe,
com esse comportamento negativo, a própria integridade da Lei
Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da
erosão da consciência constitucional (ADI 1.484-DF, Rel. Min. CELSO DE
MELLO). - A inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais
traduz inaceitável gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e
configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado é que nada
se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma
Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então,
de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável
somente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos
desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos
cidadãos”.(original sem grifos)
Na
doutrina estrangeira também é possível verificar o entendimento,
segundo o qual, o Judiciário tem legitimidade para declarar as omissões
inconstitucionais que inviabilizem o exercício de direitos fundamentais
garantindo através de suas decisões o exercício destes direitos.
Em
Portugal, a Constituição (1976) trouxe regras sobre a
inconstitucionalidade por omissão. Também na Alemanha e na Itália a
temática já vinha sendo discutida desde o final da década de 50 e início
da década de 60.
Na Itália, por exemplo, com o passar das décadas e a frequente atuação da Corte Constituzionale no
exercício do controle de constitucionalidade, surgiram debates
envolvendo a possibilidade de atuação do Judiciário quando verificada
uma inconstitucionalidade por omissão capaz de ensejar a inviabilidade
do exercício de direitos constitucionalmente previstos.
Logo,
conforme amplamente debatido no Direito Europeu, para que seja possível
atuação do Judiciário, dois requisitos devem ser observados: a
existência de omissão legislativa inconstitucional (rime obbligate, na
expressão cunhada por Crisafulli, deve ser fruto de uma solução
constitucionalmente obrigatória – e não de um juízo discricionário) e a identificação de uma solução normativa constitucionalmente obrigatória.
É
possível verificar na jurisprudência do STF, o entendimento de que,
declarada a omissão inconstitucional, cabe ao titular do direito
subjetivo procurar em ação própria a recomposição dos danos sofridos
(STF, MI 284, Relator
(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CELSO DE MELLO,
TRIBUNAL PLENO, julgado em 22/11/1992, DJ 26-06-1992 PP-10103 EMENT
VOL-01667-01 PP-00001 RTJ VOL-00139-03 PP-00712).
Acerca
da possibilidade de o cidadão intentar via ação própria pleiteando a
indenização com vistas à respectiva reposição patrimonial devido a
prejuízos causados por omissão legislativa do art. 37, X, foi proferido
acórdão do TRF-5ª Região nos seguintes termos:
“CONSTITUCIONAL
E ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS. REAJUSTE ANUAL. ART. 37, X DA
CF/88. MORA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. OMISSÃO LEGISLATIVA. DIREITO À
REPARAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DE AÇÃO PRÓPRIA. UTILIZAÇÃO DO INPC.
CABIMENTO. LEGITIMIDADE DO SINDICATO. - No que concerne à revisão geral
da remuneração dos servidores da União (art. 37, X da CF/88), o col. STF
já declarou a mora legislativa por falta de iniciativa do projeto de
lei pelo Presidente da República, quando do julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão n. 2.061-7-DF. Em Mandado de Injunção
(nº 562-9-RS), o STF também
já se pronunciou no sentido de que uma vez declarada a omissão
legislativa, cabe ao titular do direito subjetivo buscar a reposição
patrimonial através do exercício de ação própria. - Possibilidade de ser fixado o percentual do reajuste pelo Judiciário - constatada a omissão de quem deveria propor o projeto de lei e fixar esse ponto - através
de um critério objetivo de correção, previsto em lei, uma vez que
estará o Judiciário apenas aplicando a norma, o que é seu papel
essencial. - Não é
desarrazoado se fixar o percentual do INPC aplicado nos casos de
reajustes dos benefícios previdenciários, donde tem se valido o Governo,
desde o ano de 1998, para atender as revisões desse seguimento social, o
qual foi considerado constitucional pelo STF, posto que revelador da
inflação que a classe média suporta em face de na composição do índice
ter peso maior os valores da cesta básica, transportes e mensalidades
escolares. - Direito aos efeitos indenizatórios, de acordo com o INPC
compreendendo os anos de 1999, 2000 e 2001 e 2002, aplicando-se o índice
desse indexador do exercício anterior ao da concessão, a partir do ano
de 1998, data da promulgação da Emenda Constitucional que assegurou o
direito aqui postulado. - Recurso adesivo prejudicado. - Apelação e
remessa oficial providas em parte.( AC N.º 317936/RN, Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5, Primeira Turma, DJ - Data::15/04/2005 - Página::989 - Nº::72)”
No
julgamento do Recurso Extraordinário do caso mencionado, o STF manteve o
entendimento do Tribunal Regional Federal da 5ª Região julgando-o
constitucional (STF. Primeira Turma. RE 472678. Relator: Marco Aurélio, j. 25/04/2006. DJ 17/05/2006.).
No
presente caso, não se trata de aumento salarial (vedado pelo artigo
2º-B da Lei 9.494/97), ou indenização, mas sim de revisão, buscando
afastar os efeitos que a inflação gera. Tanto a indenização quanto a
revisão buscam a necessária manutenção do poder aquisitivo da
remuneração. Conforme afirma o Min. Marco Aurélio no julgamento do RE 565.089 - SP, com repercussão geral reconhecida, em feito de sua relatoria pendente de julgamento no STF:
“Consoante
a jurisprudência tradicional do Supremo, mostra-se inviável o aumento
remuneratório de servidor público por decisão judicial, porquanto o
Poder Judiciário não possui função legislativa – Verbete nº 339 da
Súmula: “não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa,
aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia”.
A visão é correta. Não há espaço para a concessão de aumento pela via
judicial, mas os recorrentes não buscam isso. Buscam a indenização pelo
descumprimento de um dever jurídico, consistente no inadimplemento de
majoração remuneratória para resguardo da equação entre remuneração e
trabalho.O Supremo já
assentou que “a correção monetária não se constitui em um plus, não é
uma penalidade, mas mera reposição do valor real da moeda corroída pela
inflação” – Agravo Regimental na Ação Cível Originária nº 404, da relatoria do Ministro Maurício Corrêa.”(original sem grifos)
No mesmo sentido, elucida a Min. Carmen Lucia em sua obra:
“Como a revisão não importa em aumento mas em manutenção do valor monetário correspondente ao quantum devido,
fixou-se a sua característica de generalidade, quer dizer atingindo
todo o universo de servidores públicos.” (In ROCHA, Cármen Lúcia
Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo:
Saraiva, 1999, p. 324)(original sem grifos)
Diante
disso, levando em consideração a finalidade do instituto de manter o
poder aquisitivo da moeda em face da inflação, entendo que a
recomposição baseada em período inflacionário superior a um ano
configura direito subjetivo do agente público destinatário da norma,
consubstanciando verdadeiro poder-dever do Estado restabelecer o valor
da remuneração e dos subsídios em razão das perdas inflacionárias.
Por
essa delimitação constitucional do perfil da revisão, que guarda
relação com a variação do processo inflacionário, percebe-se que o
percentual a ser atribuído a título de revisão geral anual deve sempre
espelhar a inflação do período apurada pelos índices oficiais. A
reposição há que ser na exata medida do que se perdeu, no mínimo, não
havendo espaço para fixação de qualquer outro índice aleatório.
Logo,
para que se torne eficaz o comando constitucional em questão, este
juízo entende que seria cabível a utilização do índice IPCA, que é o
índice oficial utilizado pelo Banco Central e que foi utilizado na lei nº 12.770, de 28 de dezembro de 2012. Todavia, como
o pleito autoral se baseia no INPC, índice inclusive inferior ao IPCA, e
tendo em vista que ambos são desenvolvidos pelo IBGE, por uma questão
de razoabilidade, deverá ser utilizado o INPC, conforme também se valeu o
TRF-5, no acórdão supramencionado.
Analisando
os autos, percebe-se que o autor na época do último reajuste (fev de
2009) exercia o cargo de agente de segunda classe, com remuneração de R$
7.885,99, sendo promovido para primeira classe em fevereiro de 2011,
recebendo, desde esta data, a quantia de R$ 9.468,92.
Compulsando as alegações autorais e o sítio eletrônico do IBGE,
verifica-se que os dados são conflitantes, de modo que este juízo
entende prudente se valer dos dados oficiais e não aqueles trazidos pela
parte.
Cabe
ainda ressaltar que o autor pleiteia a revisão do período de março de
2010 a outubro de 2013. No entender desde juízo, o reajuste deveria
ocorrer desde março de 2009, haja vista ser a data do último reajuste,
contudo, não se mostra possível aplicar tal raciocínio, já que se
estaria extrapolando o pleito autoral. De qualquer forma, isso é
irrelevante aqui, pois a ordem cabível neste feito é a da inclusão da
reposição. Os atrasados deverão ser objeto de ação própria, onde poderá
pedir o que melhor lhe convier.
Além da questão revisional, não se deve olvidar a situação crítica em que se encontra a Policia Federal.
A corporação vem sofrendo com problemas estruturais alarmantes. Segundo matéria do Jornal Folha de São Paulo junto a MARCOS LEÔNCIO SOUSA RIBEIRO,
presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal
(ADPF) e membro do Conselho Nacional de Segurança Pública, percebe-se o
descaso com a instituição.
Cite-se, por exemplo: “Para
concluir as investigações que culminaram com a prisão do bicheiro
Carlinhos Cachoeira, os policiais federais se desdobraram em jornadas de
trabalho que chegavam a 15 horas diárias, de segunda a segunda. Por
falta de pessoal, o mesmo policial que trabalhava no monitoramento
telefônico também tinha que ir a campo fazer diligências. Houve policial
que teve seu filho nascendo durante a operação e não pode se ausentar
um dia sequer. Esse é um retrato da Polícia Federal que o Brasil
desconhece e que o governo finge não ver.”.
Esse
retrato é agravado por condutas governamentais preocupantes, como, por
exemplo, a determinação de que todas as diárias sejam submetidas a
autorização prévia.
O pagamento das diárias viabiliza o deslocamento da PF para realizar
operações, não se mostra razoável, por uma questão de segurança pública e
celeridade, exigir autorização prévia para tanto. Alguns grevistas
ainda alegam que o sucateamento da PF seria uma represália do governo
federal as frequentes operações que investigam políticos.
A polícia federal encontra-se em situação de abandono: “Temos
salários inferiores ao das polícias legislativas do Senado e Câmara e
das polícias civis de vários Estados. Nossa gratificação de chefia é dez
vezes menor do que a Polícia Civil do Distrito Federal. Temos menos
gratificações e chefias do que a Funai. Além disso, falta uma estrutura
administrativa adequada, não há reposição salarial da inflação e há a
demora na implantação de benefícios para os policiais lotados nas
fronteiras. Com tudo isso e com a iniciativa legislativa de esvaziamento
da aposentadoria policial, a PF ruma para um quadro de descontentamento
generalizado. As consequências são imprevisíveis, mas de antemão a
criminalidade agradece.”
A situação é tão grave que existem conflitos internos entre agentes e delegados da polícia federal.
A precariedade da corporação e a diferença salarial prejudica o
trabalho e fomenta as disputas, causando efeitos drásticos à segurança e
até mesmo ao trabalho do Ministério Público Federal que depende da PF
para realizar investigações.
A
recusa do Governo Federal em conceder aumentos aos agentes, com os
quais vinha negociando, e sua tentativa de impor o tratamento geral dado
no último reajuste é inaceitável. Primeiro, a postura do Governo,
largamente noticiada na imprensa, que ou se aceitava o valor oferecido
ou não haveria aumento algum é, no final das contas, usar de violência
institucional.
A
eventual recusa de algum grupo de servidores à proposta (ruim) feita
pelo Governo não desonera este de cumprir os ditames constitucionais
onde aparece a necessidade de revisão. Quando menos, deveria, ainda que a
contragosto dos policiais, conceder o aumento. Ocorre que o governo se
vale da pressão e do poder de não dar aumento algum. “Poder” no sentido
de capacidade, não no sentido de legitimidade ou legalidade, vez que,
repita-se, a Constituição não deixa essa revisão ao alvedrio do Governo.
Curioso, não se pode deixar de notar que o Governo, levado a cabo por
um Partido dos Trabalhadores, aja com os servidores públicos de forma
muito semelhante à dos piores capitalistas.
Acresça-se
que os delegados tiveram reajuste e os agentes não, agravando ainda
mais, e bastante, o confronto entre ambos os grupos. A quem interessa
isso? Será que não se percebe que destruir a Polícia Federal é ruim para
todos? Ou, talvez, não todos, já que há muitos que ficarão felizes se a
Polícia Federal estiver operacional e moralmente morta.
O
que não se compreende é que um Governo, que deve agir em prol da
sociedade e do Estado, não se comova com esta situação, convivendo
exageradamente bem com a situação cada vez mais caótica da Polícia
Federal.
Nas
redes sociais, um dos meios da nova democracia direta que a tecnologia
parece estar permitindo, e palco de movimentos sociais e deflagração de
movimentos maiores e manifestações nas ruas, há uma enorme maioria que
imputa tudo isso ao que chamam de “vingança” contra a Polícia Federal
por conta das investigações bem sucedidas que fez e que resultou na
prisão de poderosos. Este Juízo, contudo, não quer acreditar nessa
versão. Eliminada esta hipótese, resta a alternativa da mera omissão.
Omissão juridicamente relevante e que produz resultado no mundo material
idêntico ao que uma vingança, se fosse o caso, criaria: a destruição da
Polícia Federal. Então, mesmo que se negue a ideia de vingança contra a
Polícia, ninguém pode admitir este estado de coisas.
É
fato notório que ocupantes da carreira policial no Congresso Nacional
pátrio, contra quem nada temos, recebem o dobro dos policiais federais
e, ainda que não estejamos pretendendo de modo algum nos opor ao
prestígio vencimental dos policiais no Congresso, tal realidade revela
injusta discrepância entre carreiras policiais em contraposição aos
riscos reais e graves condições de atuação, quantidade de tiros e
ameaças de morte que os policiais federais, Delegados e Agentes recebem
cotidianamente.
Com o descontentamento da instituição a onda de protestos no país é evidente.
Inúmeras manifestações já ocorreram e outras já estão marcadas até para
março, inclusive a possibilidade real de greve durante a Copa.
Uma
forma de ver o problema é esperar que a Polícia não faça isto durante a
Copa. Outra, no entanto, é reconhecer que diante da omissão e dos
ouvidos tapados por parte do Governo, talvez ocasião tão importante e
dramática seja o único, ou ao menos um bom, momento para que o Governo e
a população venham a ouvir o grito de desespero de uma instituição
honrada que está sendo covardemente destruída. Ninguém que ame o serviço
público pode assistir placidamente as maldades que a Polícia Federal
vem sofrendo.
Particularmente,
constrange a este julgador visitar Brasília e ver um estádio de
aproximadamente R$1.500.000.000 (hum bilhão e meio), construído para
abrigar apenas duas coisas: um único jogo de futebol e o desinteresse
das autoridades pelas reais necessidades públicas. Some-se a esse 1,5
bilhão, mais um outro depositado para comprar uma refinaria obsoleta nos
EUA, mais um outro tanto para fazer um porto em Cuba e nos indagamos o
que não seria se usássemos esse dinheiro para a Polícia e a Receita
Federal terem meios para cumprir suas funções institucionais.
enho
mais orgulho da Colômbia, que declinou da Copa, e da Suécia, que
decidiu não se candidatar como sede dos Jogos Olímpicos de Inverno de
2022. Eis o que diz a matéria publicada na Revista Exame ( http://exame.abril.com.br/mundo/noticias/suecia-recusa-jogos-de-2022-para-nao-usar-dinheiro-publico, acesso às 17:h26 de 06/3/2014):
“Em
votação entre os partidos políticos na semana passada, com apoio até do
prefeito da cidade, os suecos optaram por não se candidatar à disputa
para receber o evento.
Os
argumentos? A cidade tem prioridades mais importantes, a conta para
organizar os jogos seria alta demais e um eventual prejuízo teria de ser
coberto com dinheiro público.
Para
os partidos, aceitar os jogos seriam “especular com o dinheiro do
contribuinte”. O primeiro-ministro Fredrik Reinfeldt também se mostrou
contra.
"Não
posso recomendar à Assembleia Municipal que dê prioridade à realização
de um evento olímpico. Temos outras necessidades, como a construção de
mais moradias", disse o prefeito Sten Nordin, em declarações publicadas
pelo jornal Dagens Nyheter e reproduzidas pela BBC.
No
jornal Dagens Nyheter, o secretário municipal de Meio Ambiente de
Estocolmo, Per Ankersjö, escreveu um artigo defendendo a decisão.
“Os
cidadãos que pagam impostos exigem de seus políticos mais do que
previsões otimistas e boas intuições [sobre o orçamento]. Não é possível
conciliar um projeto de sediar os Jogos Olímpicos com as prioridades de
Estocolmo em termos de habitação, desenvolvimento e providência
social", disse.
Qual
é o país rico, e qual o pobre? E por quais razões a Suécia é
considerada, em todos os índices internacionais, um lugar melhor do que o
Brasil para se viver? E qual a razão do Juízo citar estes gastos com
Copa etc, e os exemplos de outras nações? Simples: como dizer que não
existe dinheiro para a revisão constitucional se existe para gastar
tanto com a Copa?
Ao
lado disso, acrescento: como dizer que não existe dinheiro para a
revisão se foi oferecido um percentual e ao menos este não foi aplicado?
Se
por um lado há uma discricionariedade nas políticas do governo, por
outro não se pode fechar os olhos à realidade e, menos ainda, deixar de
se exigir o cumprimento dos direitos assegurados no texto expresso da
Carta Magna de nossa República.
II - DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
Ante o exposto, à luz da fundamentação supra,
cumpre verificar se, nos termos do art. 273, I, do CPC, restaram
preenchidos os requisitos necessários para a concessão da tutela
antecipada, quais sejam: i) prova inequívoca; ii) verossimilhança das
alegações; iii) fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação.
O
primeiro requisito está comprovado. Compulsando os autos verifica-se
que a remuneração do autor não sofre revisão desde 2011 e que a última
revisão da categoria se deu em 2009.
No
tocante à verossimilhança, restou patentemente demonstrada a existência
de uma omissão inconstitucional que inviabiliza o exercício de direito
constitucionalmente previsto. Presente, portanto, o segundo requisito.
Quanto
ao terceiro requisito, ante a situação em que se encontra a PF e a
falta de reajuste desde 2009, não resta dúvida acerca à existência de
fundado dano ao patrimônio autoral. Consoante o parecer do ex Procurador
Geral da República Roberto Gurgel, no bojo do Mandado de Injunção n. 4.068: “A
norma garantidora da revisão geral anual constitui, nitidamente, uma
das facetas da pretendida valorização da função pública para o
atendimento de interesses públicos primários em nível de excelência
consentâneo com o ideal constitucional. Assim, a revisão prescrita no
inciso X do artigo 37 da Constituição Federal foi concebida como a
necessária correção da expressão nominal da remuneração, com vistas à
recomposição do poder aquisitivo da moeda em face das perdas
inflacionárias, devendo ocorrer de forma geral, destinada
indiscriminadamente a todas as carreiras de servidores, e com
periodicidade anual.”
Não se deve olvidar que a Súmula 729 do STF dispõe que pode ser concedida antecipação de tutela em benefício previdenciário. Ora, vencimentos
de servidor, assim como o benefício previdenciário, têm caráter
alimentar e estão ligados ao mínimo existencial e a dignidade da pessoa
humana, vetor maior da Constituição da República (art. 1º, III). Diante
da situação caótica em que se encontra a instituição, não é digno, quiçá
razoável, que tal prestação de caráter essencial seja menoscabada pela
Administração Pública.
A
desorganização e omissão legislativa do executivo não pode ser
argumento para não pagar verba ligada ao mínimo existencial, já que a
Lei de Diretrizes Orçamentárias prevê remanejamento de verbas e
cancelamento de dotações para suprir despesas insuficientes.
Ademais,
não há que se falar em perigo de irreversibilidade do provimento porque
é o próprio vencimento do servidor que garantirá o eventual
ressarcimento ao erário no caso de improcedência.
Por
fim, este Juízo está ciente de que a Jurisprudência dominante nos
Tribunais Regionais Federais entende que a revisão prevista no art. 37,
X, da Constituição não pode ser concedida pelo Judiciário (APELRE
200551010132310, Juíza Federal Convocada CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA,
TRF2 - SEXTA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data: 20/04/2012 - Página:
312/313; AC - APELAÇÃO CIVEL - 442079, Desembargador Federal JOSE
ANTONIO LISBOA NEIVA, TRF2, SÉTIMA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data:
21/07/2011 - Página: 194), todavia, ousamos discordar desse
posicionamento para dar efetividade à Constituição, conforme adrede
fundamentado.
III - DISPOSITIVO
Isto
posto, diante da repercussão social que o caso possui, por ser questão
de segurança pública, bem como a situação degradante em que se encontra a
Policia Federal e tendo em vista que o posicionamento ora defendido
encontra respaldo na doutrina e jurisprudência pátria e também
alienígena, possuindo, inclusive, campo fértil para sua efetivação na
leitura dos casos julgados pelo STF, DEFIRO O PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, nos termos do art. 273, I, c/c, art. 461, §3°, ambos do CPC, e o disposto na Súmula 729 do STF, para que a ré, UNIÃO
FEDERAL, proceda à revisão do subsídio mensal do autor com base no
índice de 21,47%, equivalente ao INPC de março de 2010 a outubro de
2013, criando a respectiva rubrica, sem prejuízo da cobrança pelo autor
dos atrasados em ação própria. Oficie-se ao Órgão Pagador para que
cumpra a liminar.
Fica
a parte ré ciente de que o descumprimento de tal decisão ensejará a
cominação de astreintes do valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia, sem
prejuízo da majoração de seu valor até que a medida surta o efeito
devido, qual seja, o cumprimento da ordem judicial, tudo, sem prejuízo
das sanções civis, penais e administrativas de todos os responsáveis
pelo eventual descumprimento da ordem judicial.
Intime-se para imediato cumprimento.
P. R. I.
Niterói, DATE @ "d` de `MMMM` de `yyyy" * MERGEFORMAT 7 de março de 2014
(assinado eletronicamente)
WILLIAM DOUGLAS RESINENTE DOS SANTOS
Juiz Federal Titular
Fonte: http://fenapef.org.br/fenapef/noticia/index/44429
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