segunda-feira, 8 de setembro de 2014
STJ asfata crime por registro vencido de arma
HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO
ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO
JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME
EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO
LEGAL. 2. ART. 12 DA LEI N. 10.826/2003. POSSE DE ARMA DE FOGO DE
USO PERMITIDO COM O REGISTRO VENCIDO. ATIPICIDADE MATERIAL DA
CONDUTA. SUBSIDIARIEDADE DO DIREITO PENAL. PUNIÇÃO ADMINISTRATIVA
QUE SE MOSTRA SUFICIENTE. 3. ORDEM NÃO CONHECIDA. HABEAS CORPUS
CONCEDIDO DE OFÍCIO.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a
racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema
recursal, vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser
imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às
hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo
Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal
Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por
objetivo substituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie.
Precedentes. Contudo, devem ser analisadas as questões suscitadas na
inicial no intuito de verificar a existência de constrangimento
ilegal evidente - a ser sanado mediante a concessão de habeas corpus
de ofício -, evitando-se prejuízos à ampla defesa e ao devido
processo legal.
2. O trancamento de ação penal na via estreita do writ configura
medida de exceção, somente cabível nas hipóteses em que se
demonstrar, à luz da evidência, a atipicidade da conduta, a extinção
da punibilidade ou outras situações comprováveis de plano,
suficientes ao prematuro encerramento da persecução penal. Na
espécie, o paciente foi denunciado pela suposta prática da conduta
descrita no art. 12 da Lei n. 10.826/2003, por possuir
irregularmente um revólver marca Taurus, calibre 38, número QK
591720, além de dezoito cartuchos de munição do mesmo calibre.
3. Todavia, no caso, a questão não pode extrapolar a esfera
administrativa, uma vez que ausente a imprescindível tipicidade
material, pois, constatado que o paciente detinha o devido registro
da arma de fogo de uso permitido encontrada em sua residência - de
forma que o Poder Público tinha completo conhecimento da posse do
artefato em questão, podendo rastreá-lo se necessário -, inexiste
ofensividade na conduta. A mera inobservância da exigência de
recadastramento periódico não pode conduzir à estigmatizadora e
automática incriminação penal. Cabe ao Estado apreender a arma e
aplicar a punição administrativa pertinente, não estando em
consonância com o Direito Penal moderno deflagrar uma ação penal
para a imposição de pena tão somente porque o indivíduo -
devidamente autorizado a possuir a arma pelo Poder Público, diga-se
de passagem - deixou de ir de tempos em tempos efetuar o
recadastramento do artefato. Portanto, até mesmo por questões de
política criminal, não há como submeter o paciente às agruras de uma
condenação penal por uma conduta que não apresentou nenhuma
lesividade relevante aos bens jurídicos tutelados pela Lei n.
10.826/2003, não incrementou o risco e pode ser resolvida na via
administrativa.
4. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido, de ofício, para
extinguir a Ação Penal n. 0008206-42.2013.8.26.0068 movida em
desfavor do paciente, ante a evidente falta de justa causa.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos
votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não
conhecer do pedido e conceder habeas corpus de ofício, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Regina Helena Costa, Laurita Vaz e
Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.
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