domingo, 23 de janeiro de 2011

“O sistema prisional do Acre é caótico e falido”, diz sindicalista






AGAZETA DO ACRE

Dom, 23 de Janeiro de 2011 00:13 JORGE NATAL .


Uma política de Segurança Pública depende, necessariamente, de uma política de Estado. Desenvolvimento deve gerar empregos e distribuir renda, com a conseqüente melhoria na qualidade de vida da população”. Esses argumentos - que mais parecem de um sociólogo - são do presidente do sindicato dos Agentes Penitenciários do Acre (Sindap/AC), Adriano Marques, ao fazer uma avaliação pessoal da segurança pública e da atual situação do sistema prisional do Estado.

Afinal de contas, em apenas 16 dias, aconteceram quatro fugas, um homicídio, uma tentativa de homicídio, uma curra (abuso sexual), um princípio de rebelião no presídio feminino, e pasmem, no momento desta entrevista, chegava a informação da descoberta do planejamento da morte de mais um agente penitenciário. Eles perderam um colega há menos de 1 ano.

Formado em Direito, Adriano assegura que os agentes penitenciários são politizados e esclarecidos. “Cerca de 70% da nossa base possui ou está fazendo curso superior”. Ele não aceita que a categoria ‘pague a conta’ sozinha. “Estamos sendo acusados de facilitar fugas e patrocinar torturas, quando sequer temos equipamentos para a nossa própria segurança. Estamos na ponta do problema, guarnecendo pessoas que a sociedade já rejeitou”, dispara o líder sindical.

Com o dobro de sua capacidade, o presídio Dr. Francisco d’Oliveira Conde seria um espaço para a reeducação e, por conseguinte, de reinserção social, mas se transformou em uma ‘universidade’ do crime. “Não basta construir presídio. É preciso repensar toda a Segurança Pública”. Proporcionalmente, o Acre possui a maior população carcerária do país.

Em meio à posse da nova equipe de governo, o sindicalista elogia as reformar das delegacias, a aquisição de carros e do helicóptero João Donato. Não obstante, ele reivindica a valorização do ‘ser humano policial’, que precisa estar motivado, com boas condições de trabalho e salários dignos. Veja abaixo a entrevista do presidente do Sindap:

A GAZETA – O que está acontecendo com o sistema prisional do Acre?

Adriano – Com o término dos contratos dos policiais militares voluntários, houve um déficit na segurança do sistema prisional. Só na Capital, estamos precisando de 200 servidores. As guaritas externas dos pavilhões não estão guarnecidas. O problema zero um é o efetivo reduzido. O dois é a falta de equipamentos de segurança e proteção para os agentes penitenciários. A gente vive sobre constantes ameaças. Atualmente, a função de agente penitenciário é a mais estressante entre todas as profissões. Por quê? A PM faz a abordagem inicial com o cidadão infrator e o encaminha para a Polícia Civil. Esta faz a investigação e, no caso de condenação, remete-o para o sistema penitenciário. Em síntese, a gente trabalha como o ‘produto final’ da Segurança Pública. Somos trabalhadores, pais de família e qualificados para o exercício da função. No ano passado, perdemos um colega sócio-fundador do sindicato. Até hoje esse crime não foi esclarecido. A responsabilidade é do Governo do Estado. Quanto às acusações de tortura e maus-tratos, não existe uma única prova que incrimine agentes penitenciários. Propomos a imediata instalação de monitoramento por sistema de vídeo, integrado em todas as unidades do Estado, 24h por dia.

A GAZETA – Você concorda com a avaliação de que o sistema prisional do Estado está ‘caótico’, beirando a ‘falência’?

Adriano – Inteiramente. O presídio é um barril de pólvora. Ele está começando a explodir aos poucos. Os presos têm todo tempo do mundo para fazer planejamentos. Quando eles perceberam que as guaritas estavam sem vigilância e nosso efetivo reduzido, eles agiram. Não existe um treinamento contínuo e muito menos um programa para cuidar da saúde mental do servidor. Temos casos de surtos psicóticos, síndromes do pânico, gastrites nervosas e distúrbios do sono. Tudo isso é consequência do stress funcional e da elevada jornada de trabalho, que é na escala de 12 por 36h.

A GAZETA – E as fugas? Em que circunstâncias elas aconteceram?

Adriano - Na primeira eram apenas dois agentes para vigiar um pavilhão com 236 presos. No dia, a guarita externa, que fica acima do pavilhão, estava desguarnecida por falta de efetivo. Na outra fuga, os presos se evadiram pelo forro da enfermaria. Veja bem, ele jamais poderia ser de madeira. Todos esses descontroles poderiam ter sido evitados, também, se tivéssemos um sistema de monitoramento por vídeo.

A GAZETA- Quais são as recomendações que o senhor pode sugerir para os gestores do Iapen?

Adriano – A contratação imediata de novos agentes penitenciários, a aquisição de equipamentos de proteção e segurança para todos os agentes penitenciários. Também precisamos do poder de polícia judiciária, uma vez que os eventos ocorridos aqui dentro têm ligações com facções criminosas. Necessitamos, ainda, de uma instrução normativa interna, que iria nortear as administrações dos presídios e o nossos serviços.

A GAZETA - E se os 2.000 mandados de prisões pendentes fossem todos comprimidos?

Adriano - Seria um caos completo, pois já estamos superlotados. Existe um presídio em construção no município de Senador Guiomard, previsto para ser inaugurando ainda neste ano. Também precisamos de outros no interior. Mas não é só isso que vai resolver. Trata-se de um problema social e econômico, aliado à desagregação familiar com a ausência de valores humanos, morais e éticos. O ser humano não nasceu com propensão ao crime! Ele é engrenado na máquina social, que, na maioria das vezes, é excludente e preconceituosa. Os jovens são maioria nos presídios. Eles estão sendo tragados pelo consumo e tráfico das drogas. Isso aumenta muito a delinquência social.


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