segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Plano Nacional de Política Penitenciária



O CNPCP – Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária resolveu recomendar a aplicação do Plano Nacional de Política Penitenciária que constitue o conjunto de orientações deste Colegiado destinadas aos responsáveis pela concepção e execução de ações relacionadas à prevenção da violência e da criminalidade, à administração da justiça criminal e à execução das penas e das medidas de segurança, da forma que segue:

Medida 1: Sistematizar e institucionalizar a Justiça Restaurativa 


Detalhamento: A justiça restaurativa pressupõe um acordo livre e consciente entre as partes envolvidas; é um novo paradigma de justiça criminal. Atualmente há práticas em alguns locais, porém em número reduzido e ainda atreladas ao processo criminal formal.

Medida 2: Criação e implantação de uma política de integração social dos egressos do sistema prisional


Detalhamento: Não existe política de integração social dos egressos do sistema prisional. Alguns Estados têm ações localizadas e recentemente o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou programa voltado à empregabilidade (Começar de Novo).

Medida 3: Aperfeiçoamento do sistema de penas e medidas alternativas à prisão


Detalhamento: Superar a dicotomia discursiva que está estabelecida entre a pena de prisão e a pena não privativa de liberdade é um dos atuais desafios da política penitenciária brasileira. Deve-se reconhecer que esses sistemas são complementares e que o funcionamento efetivo de um é vital para o fortalecimento do outro. A presença no sistema carcerário de pessoas que poderiam cumprir sanções alternativas agrava problemas de superlotação e impede a concentração de esforços no combate aos crimes de maior gravidade pelo sistema prisional. Ao mesmo tempo, o sistema alternativo à prisão alcança melhores resultados quando a política prisional lhe dá o devido suporte. Nos últimos dez anos a política de penas e medidas alternativas alcançou resultados importantes. Essa experiência elevou as penas e medidas alternativas a outro estágio, de modo que os desafios de hoje são diferentes daqueles que estavam postos quando o atual modelo foi gestado. Nesse novo momento, a condução da política deve ganhar outros contornos para que possa atender às demandas atualmente impostas.

Medida 4: Implantação da política de saúde mental no sistema prisional

Detalhamento: A Lei 10.216/01, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, por seu caráter específico e posterior à Lei 7.210/84, Lei de Execução Penal, promove uma releitura nos itens que se referem à medida de segurança. Esse tema já foi detalhado pela Resolução N° 4/2010 do CNPCP e pela Resolução N° 113/2010, e Portaria 26, de 31 de março de 2011, ambas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).


Medida 5: Ações específicas para os diferentes públicos

Detalhamento: As diferenças devem ser respeitadas para gerar igualdade de direitos. As questões de gênero, de condição sexual, de deficiência, de idade, de nacionalidade, entre outras, são vividas também no campo criminal e penitenciário, e não devem ser desconsideradas. É uma questão de acesso aos direitos e de gestão das políticas públicas.


Medida 6: Prisão provisória sem abuso


Detalhamento: No sistema prisional brasileiro 44% dos presos são provisórios. Porém, o CNJ identificou que os índices de presos provisórios são diferentes nas unidades da Federação, sendo que o Distrito Federal possui o menor percentual, 20%, e o Piauí, o maior, 74%. De qualquer forma, segundo dados da International Bar Association2, uma em cada cinco destas prisões é ilegal. Este fenômeno se deve à banalização da prisão cautelar, hoje concedida rotineiramente pelos juízes de primeira instância, que muitas vezes apenas homologam as prisões em flagrante realizadas pela polícia, sem que haja fundamentação apropriada. Se analisarmos o comportamento do Poder Judiciário, veremos que em incontáveis vezes o uso da prisão provisória é feito em desacordo com a Constituição Federal. Isto pode ser verificado nos mutirões carcerários do CNJ, que revisaram 156.708 processos e beneficiaram 41.404 presos, dos quais 23.915 foram postos em liberdade.

Medida 7: Defensoria Pública plena


Detalhamento: Ainda há três Estados no País que não possuem Defensoria Pública instalada, e quase 50% dos demais Estados têm quadros de pessoal muito aquém do necessário. A maioria dos presos brasileiros é pobre, e sem a Defensoria Pública plenamente instalada não tem direito à defesa ou ao acompanhamento na fase da execução penal. As conseqüências são inúmeras.

Medida 8: Fortalecimento do controle social


Detalhamento: o sistema penal, nas suas três instâncias (policial, judicial e penitenciária), por tratar-se de um mecanismo de coerção, tende a fechar-se institucionalmente. As prisões são conhecidas como instituições totais, que, por obrigarem os sujeitos a viver exclusivamente no mesmo espaço, com a mesma rotina, com as mesmas pessoas e por ter uma hierarquia bem definida e desigual (funcionários e presos), propicia com facilidade o adoecimento psíquico, a infantilização, o abuso de poder e a perda de parâmetros sociais. É fundamental que esses espaços possam ser oxigenados com a presença da sociedade civil, inclusive para que a sociedade se envolva na prevenção da criminalidade e não reforce a ideologia da vingança, criando cada vez mais estereótipos.

Medida 9: Enfrentamento das “drogas”


Detalhamento: Desde 2008 ocorre um aumento importante do percentual de presos por tráfico de drogas no País; isso parece decorrer da Lei 11.343/2006, que aumenta a pena mínima para o crime de tráfico de drogas, institui tipos abertos e penas desproporcionais, bem como concede poderes extensos aos policiais que efetuam os flagrantes, mesmo se as apreensões forem de pequenas quantidades. É preciso avaliar: em que medida isso realmente contribui no combate ao tráfico de drogas? Ou será que se modifica apenas o lócus de sua atuação? Ao aumentar-se o número de pessoas presas, disponibilizam-se mais pessoas vulneráveis para a organização do tráfico e também mais consumidores, pois na medida em que a prisão danifica os laços familiares e profissionais, cria dependências financeiras e sociais dos grupos organizados e rotula os sujeitos, assim uma legião de jovens será empurrada para a vida marginal com eficiência e para continuação da dependência química (a prisão não trata nem física, nem psicologicamente, a dependência em drogas). Outro aspecto a ser observado é o da seletividade penal, eis que a ampliação do poder da polícia reforça a escolha de determinados indivíduos como inimigos, sendo um eficaz filtro negativo do sistema da justiça criminal, dadas as dificuldades das organizações policiais no que tange à formação, metodologia, estrutura de trabalho, corrupção e pressão midiática/social.

Medida 10: Arquitetura prisional distinta


Detalhamento: Na maioria dos casos, os Estados têm construído as mais esdrúxulas e improvisadas estruturas para abrigar pessoas presas. Constatam-se celas sem nenhuma ventilação, iluminação ou incidência de sol e com pé direito baixo em localidades com médias de temperatura de 30 a 40 graus Celsius. Ou unidades que só tem celas, sem espaço para visitas, atividades educativas ou laborais, administrativas ou alojamento para funcionários. Ou, ainda, unidades hiperequipadas com corredores gradeados, sistemas inteiramente automatizados, várias ante-salas de segurança, grades entre presos e profissionais de saúde, paredes triplas e metros de concreto armado abaixo da construção para abrigar presos acusados de furto, roubo e pequenos traficantes. Não é possível tanto descaso para com as pessoas e para com o dinheiro público.

Medida 11: Metodologia prisional nacional e gestão qualificada


Detalhamento: A atuação no sistema prisional, na maioria dos Estados, caracteriza-se por amadorismo e improviso. É urgente a criação da Escola Nacional Penitenciária (ESPEN) com atribuições de pesquisa, ensino e intercâmbio que possam desenvolver e orientar os Estados com respeito a uma metodologia nacional na área prisional, garantido o respeito aos Direitos Humanos e o cumprimento das leis e tratados internacionais. Na ausência de uma carreira melhor definida para os gestores prisionais, muitos governos recaem na escolha de policiais militares, civis ou federais, ou ainda integrantes do sistema de justiça criminal aposentados, que agravam a situação institucional porque adotam metodologias policiais em uma atividade totalmente distinta.

Medida 12: Combate aos ganhos da ineficiência


Detalhamento: Além dos problemas estruturais do sistema e das políticas imediatistas e equivocadas, a sua ineficiência criou mecanismos de compensação que em muitos momentos se configuram como barreiras objetivas para reversão do seu mau funcionamento. Todos os serviços que se tornaram economicamente rentáveis a partir das dificuldades da justiça criminal ou do uso abusivo da prisão (como o mercado das tecnologias de segurança, das administrações prisionais, das construtoras especializadas em estruturas de segurança pública, da alimentação para prisões, dos profissionais autônomos etc.) precisam ser identificados e trabalhados no sentido de que venham a ser razoáveis, inclusive oferecendo-se alternativas para que eles não se tornem mais um dos obstáculos para a reversão do quadro vigente. Outro grave entrave é a corrupção existente em todas as dimensões da execução da política criminal e penitenciária.

Medida 13: Gestão legislativa


Detalhamento: A legislação criminal e penitenciária tem sido construída com base na criminologia midiática e no populismo penal. É possível observar isso com os exemplos das leis dos crimes hediondos, originada pelo sequestro de um empresário, e posteriormente pelo assassinato de uma atriz, e pela lei que instituiu o RDD, motivada por rebeliões sucessivas. Projetos absurdos, incoerentes e pouco fundamentados são comuns, sendo combatidos com dificuldades por mandatos mais sérios e conhecedores da temática, uma vez que a pressão midiática de mentalidade vingativa cala parlamentares de todas as denominações.

Medida 14: Construção de uma visão de justiça criminal e justiça social

Detalhamento: Haveria mais pessoas presas porque há mais delito ou porque há mais políticas criminológicas centradas na prisão? Elias Carranza demonstra que os dois fatores são verdadeiros, mas, com relação ao aumento do delito, é estabelecida uma relação com a desigualdade na distribuição de renda como sendo um vetor de forte determinação, embora não seja o único. Portanto, é imperativo construir uma nova visão de justiça criminal, lastreada nas ações de justiça social. O Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI) já trouxe contribuição nessa direção, porém com pouco espaço para refletir e integrar os aspectos relacionados às políticas criminais e penitenciárias. O sistema prisional é parte integrante da dimensão da segurança pública, e deve alcançar um patamar de importância política mais relevante. A promoção da segurança social refletirá na melhora qualitativa e na diminuição quantitativa da sua estrutura, mas para isso deverá ser visto e ouvido com a mesma intensidade que os demais setores da justiça criminal.

Fonte: http://portal.mj.gov.br/cnpcp/main.asp?ViewID=%7BE9614C8C-C25C-4BF3-A238-98576348F0B6%7D&params=itemID=%7BD1903654-F845-4D59-82E8-39C80838708F%7D;&UIPartUID=%7B2868BA3C-1C72-4347-BE11-A26F70F4CB26%7D

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