segunda-feira, 23 de setembro de 2013

TJ/PR: firmou entendimento de que a questão do porte dos agepens é de competência legislativa concorrente de iniciativa do governador





ÓRGAO ESPECIAL AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N.º 963.060-4 Autor: PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ Interessados: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARANÁ E GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ Rel.: Des. GUILHERME LUIZ GOMES  AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE LEI ESTADUAL N.º 16.793/2011 PORTE DE ARMAS PARA AGENTES PENITENCIÁRIOS COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 24, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA INICIATIVA LEGISLATIVA GOVERNADOR DO ESTADO INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 66, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANA

1. Nos termos do disposto no artigo 24, inciso I, da Constituição da República, é concorrente a competência para legislar sobre porte de arma de agente penitenciário. 2. De acordo com o disposto no artigo 66, inciso II, da Constituição do Estado do Parana, é de competência privativa do Governador do Estado a iniciativa de lei sobre servidores públicos do Poder Executivo. 3. Ação direta de inconstitucionalidade procedente.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Direta de Inconstitucionalidade sob nº 963.060-4, em que é autor o Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná. I RELATÓRIO  Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná em face da existência de suposto vício formal na Lei Estadual n.º 16.793/2011.  Alega o autor, em síntese, fls. 02 a 18, que "[o] projeto de lei 735/07, que resultou na edição da Lei Estadual n.º 16.793/2011 foi de iniciativa do Deputado Estadual Prof. Luizão (fls.  511/514), tendo sido vetado pelo então Governador do Estado, Roberto Requião (fls. 529-530). Porém, o veto foi rejeitado pelos Deputados Estaduais, por 42 votos, com apenas um voto favorável e duas abstenções (fls. 528 e 552-553), resultando na promulgação da lei pelo Governador do Estado do Paraná, Carlos Alberto Richa.

Ocorre que a norma impugnada diz respeito a texto legislativo que se refere diretamente ao regime jurídico concernente aos agentes penitenciários e escolta de presos do Estado do Paraná, porquanto estabelece regra que atinge seus direitos, ou seja, o direito ao porte de arma de fogo.

Assim, a Lei Estadual n.º 16.793/2011 cuidou de tema cuja iniciativa é privativa do Governador do Estado, afrontando o disposto no art. 66, II, da Constituição Estadual.", fls. 04/05.
Requer, dentre outras providências, a concessão de liminar e, ao final, a procedência do pedido inicial, "... para declarar a inconstitucionalidade formal da Lei Estadual n.º 16.793/2011, por incompatibilidade vertical com os art. 66, inc. II e art. 7º, caput, da Constituição Estadual.", fl. 15.
Com a petição inicial foram juntados os documentos de fls. 16 a 572.  Informações do Excelentíssimo Governador do Estado do Paraná, fls. 610 a 612.  Manifestação da douta Procuradoria-Geral do Estado, fls. 614 a 617.  Informações da egrégia Assembleia Legislativa do Estado do Paraná, fls. 619 a 626, acompanhada dos documentos de fls.  627 a 670.  Manifestação da douta Procuradoria-Geral de Justiça, fls. 677 a 692. 

É o relatório. 

II VOTO E SEUS FUNDAMENTOS 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, voto pelo conhecimento da ação direta de inconstitucionalidade. 

DA COMPETÊNCIA 

A douta Procuradoria Geral do Estado em sua manifestação, fls. 614 a 617, alegou que "... a Lei atacada trata de  concessão de porte de arma de fogo aos integrantes do quadro efetivo de Agentes Penitenciários e Escolta de Presos do Estado do Paraná.
Parece-nos que tal norma, de iniciativa parlamentar, sofre de inafastável vício de usurpação de competência legislativa da União.
O porte de arma de fogo é matéria relativa ao direito penal, além de estar relacionada ao uso de material bélico, razão pela qual, o advento de lei que trata sobre esses temas é de competência privativa da União, nos termos do artigo 22, incisos I e XXI da Constituição da República", fl. 616.

No entanto, consoante julgados abaixo transcritos, este egrégio Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a questão do porte de armas dos agentes penitenciários é de competência legislativa concorrente, nos termos do disposto no artigo 24, inciso I, da Constituição da República, in verbis: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;"

"MANDADO DE SEGURANÇA. AGENTE PENITENCIÁRIO QUE PRETENDE A OBTENÇAO DO PORTE DE ARMA DE FOGO. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇAO DE CAPACIDADE TÉCNICA E APTIDAO PSICOLÓGICA PARA O MANUSEIO DE ARMA DE FOGO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇAO, DE PLANO, DE QUE O AGENTE PENITENCIÁRIO PREENCHE OS REQUISITOS  EXIGIDOS PELO ART. 36 DO ESTATUTO.  MATÉRIA DE DIREITO PENITENCIÁRIO. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SEGURANÇA DENEGADA."(Mandado de Segurança n.º 724.901-8 4ª Câmara Cível em Composição Integral rel. Juiz Everton Luiz Penter Correa Julgamento: 17.05.2011).
"MANDADO DE SEGURANÇA - PORTE DE ARMA DE FOGO PARA AGENTE PENITENCIÁRIO - ESTATUTO DO DESARMAMENTO - NORMA GERAL - COMPETÊNCIA DE LEGISLAÇAO CONCORRENTE - LEI ESTADUAL 13.666/2002 - AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA - DIREITO LÍQUIDO E CERTO NAO DEMONSTRADO - SEGURANÇA DE- NEGADA."(Mandado de Segurança n.º 724.916-9 4ª Câmara Cível em Composição Integral rel.ª Juíza Lélia Samardã Giacomet Julgamento: 08.02.2011).
Destarte, possui o Estado do Paraná competência concorrente para legislar a respeito da matéria em análise.
DA INICIATIVA LEGISLATIVA

Constatada a competência concorrente do Estado do Paraná para legislar a respeito da matéria em análise, resta examinar a legitimação para a iniciativa legislativa. Em conformidade com o disposto no artigo 1º, parágrafo único, e artigo 3º caput, 1º e inciso IV, da Lei Estadual n.º 13.666/02:
"Art. 1º - Fica instituído o Quadro Próprio do Poder Executivo do Estado do Paraná QPPE, composto pelos atuais ocupantes de funcionários civis da Administração Direta e Autárquica, pertencentes ao Quadro Geral do Estado QGE, que organizará os cargos públicos de provimento efetivo, decorrentes da alteração, em seis carreiras, fundamentado nos princípios de qualificação profissional e de desempenho, com a finalidade de assegurar a continuidade da ação administrativa e a eficiência do serviço público. Parágrafo único As disposições da presente Lei não se aplicam aos funcionários dos demais quadros de pessoal integrantes de carreira estabelecidas por legislação própria.
...
Art. 3º - As Carreiras do Quadro Próprio do Poder Executivo do Estado do Paraná QPPE, serão organizadas em 08 (oito) Cargos, disposto de acordo com a natureza profissional, complexidade de suas atribuições e nível de escolaridade, sendo que, cada cargo será composto de 03 (três) classes III, II e I, com as quantidades na forma do disposto nos Anexos I e VI desta Lei. 1º - As carreiras do Quadro Próprio do Poder Executivo do Estado do Paraná QPPE, são: Apoio, Execução, Aviação, Penitenciária, Profissional e Fazendária, conforme segue: ... IV Penitenciária, composta pelo cargo de Agente Penitenciário;"
 Das estipulações contidas na citada lei estadual depreende-se que o cargo de agente penitenciário integra carreira do Quadro Próprio do Poder Executivo do Estado do Paraná QPPE. 

Desta forma, as normas relativas a direitos e prerrogativas de referidos servidores são de iniciativa legislativa privativa do Governador do Estado, consoante estabelece o art. 66, inciso II, da Constituição do Estado do Parana, in verbis:"Art. 66. Ressalvado o disposto nesta Constituição, são de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre: ... II servidores públicos do Poder Executivo, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria, reforma e transferência de policiais para a reserva;"(ausente de grifo no original). 

A respeito da iniciativa legislativa privativa do Chefe do Poder Executivo leciona a doutrina: André Ramos Tavares, in Curso de Direito Constitucional, Saraiva, 5ª edição, pág. 1099:"A Constituição elenca uma série de matérias que são de iniciativa exclusiva do Presidente da República ( 1º do art.  61).  Pertence apenas ao Presidente da República a iniciativa das leis que fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas ou que disponham sobre militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva. 

Da mesma maneira quanto às leis que disponham, quanto à União, sobre: 1º) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, ou aumento de sua remuneração; ou 2º) sobre servidores e seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; ou 3º) sobre a criação, estruturação e atribuições dos ministérios e órgãos da Administração Pública, ou, ainda, 4º) sobre o Ministério Público e Defensoria Pública da União."ausente de grifo no original. 

Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco, in Curso de Direito Constitucional, Saraiva, 2ª edição, pág. 875:"O art. 61, 1º, I e II, da Constituição elenca assuntos da iniciativa privativa do Presidente da República, que abrange leis que fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; que disponham sobre criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; que versem sobre organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; que cuidem dos servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; que estabeleçam a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; que fixem a criação e extinção de Ministérios e órgãos da Administração Pública, observado o disposto no art. 84, VI; que cogitem dos militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva."ausente de grifo no original.  Alexandre de Moraes, in Direito Constitucional, Atlas, 24ª edição, pág. 646:"As referidas matérias cuja discussão legislativa dependa de iniciativa privativa do Presidente da República (CF, art. 61, ) são de observância obrigatória pelos Estados-membros que, ao disciplinar o processo legislativo no âmbito das respectivas Constituições estaduais, não poderão afastar-se da disciplina constitucional federal.
Assim, por exemplo, a iniciativa reservada das leis que versem o regime jurídico dos servidores públicos revela-se, enquanto prerrogativa conferida pela Carta Política ao Chefe do Poder executivo, projeção específica do princípio da separação de poderes, incidindo em inconstitucionalidade formal a norma inscrita em Constituição do Estado que, subtraindo a disciplina da matéria ao domínio normativo da lei, dispõe sobre provimento de cargos que integram a estrutura jurídico-administrativa do Poder Executivo local."
Pedro Lenza in Direito Constitucional Esquematizado, Saraiva, 13ª edição, revista, atualizada e ampliada, págs.
387/388:"9.11.3. Fase de iniciativa A primeira fase do processo legislativo é a fase de iniciativa, deflagradora, iniciadora, instauradora de um procedimento que deverá culminar, desde que preenchidos todos os requisitos e seguidos todos os trâmites, com a formação da espécie normativa.
Buscando critérios classificatórios, dividimos as hipóteses de iniciativa em: geral, concorrente, privativa, popular, conjunta, do art. 67 e a parlamentar ou extraparlamentar.
(...) 9.11.3.3.2. Inciativa reservada aos Governadores dos Estados e do DF e aos Prefeitos simetria com o modelo federal As hipóteses previstas naConstituição Federall de iniciativa do Presidente da República, pelos princípios da simetria e da separação de Poderes, devem ser observadas em âmbito estadual, distrital e municipal, ou seja, referidas matérias terão de ser iniciadas pelos Chefes do Executivo (Governadores dos Estados e do DF e Prefeitos), sob pena de se configurar inconstitucionalidade formal subjetiva.
Nesse sentido, `processo legislativo dos Estados- Membros: absorção compulsória das linhas básicas do modelo constitucional federal entre elas, as decorrentes das normas de reserva de iniciativa das leis, dada a implicação com o princípio fundamental da separação e independência dos Poderes: jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal' (ADI 637, rel.  Min. Sepúlveda Pertence, j. 25.08.2004, DJ, 1º.10.2004).
Ou, ainda, `à luz do princípio da simetria, é (sic) de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo estadual as leis que disciplinem o regime jurídico dos militares (art. 61, 1º, II, `f', da CF/1988). Matéria restrita à iniciativa do Poder Executivo não pode ser regulada por emenda constitucional de origem parlamentar' (ADI 2.966, rel. Min. Joaquim Barbosa, j.
06.04.2005, DJ, 06.05.2005)."
A alegação da egrégia Assembleia Legislativa do Estado do Paraná no sentido de que"... diferentemente de como alegado pela entidade autora, não procede a ideia de que a matéria tratada no ato normativo atacado venha a interferir no regime jurídico dos servidores públicos do Estado do Paraná da classe de agentes penitenciários, tampouco usurpar a iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo.", fl. 622, pauta-se em premissa equivocada.

Com efeito, ainda que se considere por hipótese que a questão relativa ao porte de armas dos agentes penitenciários não se refira ao seu regime jurídico, certo é que nos termos da citada Lei Estadual 13.666/02, referido cargo de agente penitenciário integra a carreira do Quadro Próprio do Poder Executivo do Estado do Paraná QPPE, o que é suficiente para atribuir ao Chefe do Poder Executivo iniciativa legislativa reservada.
Isso porque, tanto o artigo 66, inciso II, da Constituição do Estado do Parana, quanto os ensinamentos doutrinários invocados, enunciam que é de iniciativa legislativa privativa do Chefe do Poder Executivo as leis que disponham sobre servidores públicos do Poder Executivo.  
Destarte, por qualquer ângulo que se analise a questão, conclui-se que o pedido inicial resulta procedente.
Em face do exposto, voto pela procedência do pedido inicial, declarando, por consequência, a inconstitucionalidade formal por vício de inciativa da Lei Estadual n.º 16.793/2011.
III DISPOSITIVO ACORDAM os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores CLAYTON CAMARGO, Presidente, TELMO CHEREM, JESUS SARRAO, REGINA AFONSO PORTES, CARVILIO DA SILVEIRA FILHO, MIGUEL PESSOA, JORGE WAGIH MASSAD, SHIROSHI YENDO, MARQUES CURY, MARIA JOSÉ DE TOLEDO MARCONDES TEIXEIRA, ANTONIO LOYOLA VIEIRA, PAULO HABITH, EUGÊNIO ACHILLE GRANDINETTI, ASTRID MARANHAO DE CARVALHO RUTHES, LUÍS CARLOS XAVIER e D'ARTAGNAN SERPA SÁ.
Curitiba, 01 de abril de 2013.
Des. GUILHERME LUIZ GOMES Relator


Comentário do sindicalista ADRIANO MARQUES:


Importante registrar que o Superior Tribunal de Justiça - STJ , possui jurisprudência com este mesmo entendimento ( RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANCA : RMS 33653) de que a questão do porte dos agepens é de competência legislativa concorrente de iniciativa do governador, ou seja , os Estados membros podem autorizar, no âmbito estadual, o porte e uso de armas de fogo pelos agentes penitenciários, dentro ou fora de serviço desde que em razão dele, mas, para tanto, deverão observar as regras no Decreto nº 5.123/04 regulamenta a Lei nº 10.826/2003. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário