domingo, 22 de maio de 2016

PCC negocia 40 toneladas de cocaína por ano




Passados dez anos da série de ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo contra agentes públicos de segurança, o poder da maior facção do Brasil só cresceu. Hoje, a organização já movimenta 40 toneladas de cocaína e arrecada R$ 200 milhões por ano, com atuação em praticamente todas as vertentes do crime.

O governo Geraldo Alckmin (PSDB), por meio das Secretarias da Segurança Pública (SSP) e da Administração Penitenciária (SAP), disse que o combate ao crime dentro e fora dos presídios é feito diuturnamente em parceria com o Ministério Público Estadual (MPE) que, por usa vez, afirma que realizou a maior investigação contra a facção e pediu a prisão de 175 líderes à Justiça, mas ainda aguarda uma posição definitiva do Judiciário.

Segundo as investigações do MPE e da Polícia Federal (PF), às quais o Estado teve acesso, mais de 80% dos rendimentos do bando vêm do tráfico de drogas. O restante tem origem em assaltos a banco, sequestros, tráfico de armas, rifas vendidas à população carcerária e mensalidade de R$ 600 cobrada de cada um dos mais de 10 mil integrantes do PCC - mais de 7 mil estão presos.

Há uma década, a arrecadação anual era de aproximadamente R$ 120 milhões. A rota internacional de tráfico começava a dar os primeiros sinais de expansão em dois países vizinhos, Bolívia e Paraguai.

Agora, em vez de sufocada pelo poder estatal, a facção amplia seus tentáculos internacionais. O MPE e a Polícia Federal já têm provas de que o tráfico de drogas, principalmente o de cocaína, atravessou o Atlântico e desembarcou na Europa e na África. O Porto de Santos é o ponto de partida dos carregamentos. Traficantes de Portugal e Holanda, por exemplo, já estão entre os clientes do PCC.

Segundo o MPE, durante uma blitz recente em um navio, foram encontrados 100 quilos de cocaína com destino à Europa. A droga estava misturada a bolsas. Ainda não há, porém, estimativa da quantidade "exportada" para os dois continentes.



Caminhada pelas ruas do centro de São Paulo relembra os dez anos dos Crimes de Maio, como ficou conhecida a série de ataques promovida por integrantes do PCC em maio de 2006. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Células - O poderio financeiro do PCC está diretamente relacionado ao tráfico de drogas. "Quanto mais droga vendida, mais dinheiro para comprar armas e drogas, que dão retorno com mais dinheiro", diz a desembargadora Ivana David, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), ao explicar o ciclo de crescimento da organização.

Ivana, que acompanhou centenas de investigações contra a facção antes dos ataques de maio de 2006, diz acreditar que o PCC só cresceu porque os integrantes que exercem funções de chefia recrutam substitutos capazes de dar sequência às atividades criminosas, caso algum líder seja preso ou morto. "São como células. Quando uma sai, há outras prontas para assumir", afirma.

Uma amostra da força financeira do PCC, que se estrutura como uma empresa, está em uma planilha apreendida durante uma operação policial. Nela consta que a facção gastou mais de R$ 1,8 milhão com advogados só no primeiro semestre do ano passado em São Paulo. Nos outros Estados, o montante no período foi de mais de R$ 730 mil.

Transformação - O procurador de Justiça Márcio Sérgio Christino, contudo, avalia que o PCC "não necessariamente cresceu, mas mudou" nos últimos dez anos. "Eles tinham um perfil inicial mais limitado, mais politizado, com um discurso em defesa dos direitos da população carcerária. Com o tempo e com as ações criminosas, o 'partido' sofreu mutações até chegar aonde chegou, uma dinâmica como a de uma grande empresa, mas com foco no tráfico, que permite arrecadação contínua".

Um dos principais responsáveis pela mais completa investigação contra o PCC, o promotor Lincoln Gakiya, de Presidente Prudente, em parceria com colegas do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), denunciou 175 integrantes da facção em outubro de 2013. Ele pediu também a prisão preventiva de mais de cem bandidos (muitos já cumprindo pena) à Justiça e a internação da cúpula e de seus principais "assessores" no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), além de mandados de busca e apreensão na casa dos acusados e de parentes.

"A intenção era adotar as medidas simultaneamente justamente para cortar o contato das lideranças com seus subordinados diretos", conta. A Justiça na cidade do oeste do Estado negou os pedidos. A Promotoria recorreu e aguarda decisão.

"Essa investigação serviu para mostrar, com provas, que o PCC nunca parou de praticar crimes. Ela expõe como a facção funciona e tem servido de base para investigações em outros Estados", diz Gakiya.

A Secretaria da Segurança informou, por meio de nota, que desde 2006 "o orçamento para a pasta cresceu 94% acima da inflação do período, passando de R$ 9,3 bilhões para R$ 24,8 bilhões em 2016 - o montante é o triplo dos R$ 8,1 bilhões reservados pelo governo federal para todo o País". A Secretaria de Administração Penitenciária afirmou que investe continuamente em modernização e ampliação da segurança no sistema prisional e, quando um detento é identificado como perigoso, "é imediatamente isolado nas penitenciárias 1 de Avaré ou 2 de Presidente Venceslau, onde o controle é ainda mais rigoroso - eles só podem sair algemados".

Negócio expandido - O poderio financeiro do PCC reflete diretamente seu poderio geográfico. À medida que as receitas da organização crescem, expandem-se também seus limites territoriais. Se, em 2013, após três anos e meio de investigações, o Ministério Público Estadual (MPE) concluiu que a facção se espalhava por 22 Estados, Distrito Federal, Bolívia e Paraguai, hoje o PCC se faz presente em todas as 27 unidades da federação e já tem bases também na Argentina, no Peru, na Colômbia e na Venezuela.

De acordo com o MPE, há evidências nas investigações que mostram contatos diretos de integrantes do PCC com o Exército do Povo Paraguaio (EPP), um grupo terrorista contrário ao governo local, e com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). "O foco está no tráfico de drogas e armas com todos os países listados. Começamos a verificar, por exemplo, o uso de fuzis argentinos no Brasil por parte de integrantes do PCC recentemente", conta o promotor Lincoln Gakiya.

No Brasil, a presença do PCC, além de São Paulo, é mais forte em Mato Grosso do Sul e no Paraná, por causa da fronteira com os países que têm bandos parceiros da facção.

Segundo investigações, aos poucos, o grupo está deixando de lado os intermediários e assumindo a compra direta de drogas. É o caso de Fabiano Alves de Souza, conhecido como Paca e apontado como o único integrante da cúpula em liberdade. De acordo com a polícia, ele vive no Paraguai e envia droga para o Brasil sob encomenda da facção. Paca estava preso no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) até 2014, quando recebeu um habeas corpus da Justiça. Sua prisão preventiva foi decretada pouco depois, mas ele nunca mais foi encontrado.

O procurador de Justiça Márcio Sérgio Christino explica que "eles (os integrantes do PCC) conseguem ocupar uma região, um estado, um país, porque há espaço. Há espaço porque conseguem fornecer drogas. É uma relação comercial", afirma.

Investigações do MPE, de outubro de 2013, além do audacioso plano de execução do governador Geraldo Alckmin (PSDB) - considerado pelos criminosos como o responsável pela "opressã" à população carcerária -, revelaram a existência de uma aliança entre o PCC e o Comando Vermelho (CV), organização do Rio. Em território nacional, essa é a única facção que estabeleceu uma parceria com a facção paulista.

Os bandidos, segundo as investigações, trocavam informações sobre métodos de assaltos e sequestros e também sobre como estabelecer o domínio dentro do sistema prisional. De acordo com Christino, isso não acontece nos demais Estados. "Tudo está baseado no crescimento do tráfico de drogas. No Rio, as facções têm meios e infraestrutura para fornecer e comprar drogas em um ritmo acelerado", revela.

Pelo restante do Brasil, o PCC tem controle garantido sobre o crime organizado. Christino diz que um revendedor de drogas cria vínculo com a facção e, desse modo, ganha projeção dentro da própria estrutura do "partido". "A facção cresce nos Estados que não têm a mesma estrutura de venda de drogas", diz o procurador. "Nos demais Estados, o PCC supre essa falta de estrutura e acaba cooptando os traficantes locais. Por isso, a facção cresce".

Em janeiro de 2015, a polícia e o MPE descobriram contas na China e nos EUA que estariam sendo usadas para lavagem de dinheiro. Entre 2013 e 2014, a suspeita é de que a facção possa ter movimentado R$ 100 milhões - o valor é uma estimativa. Segundo as investigações, o PCC ainda não está familiarizado com a lavagem de dinheiro por meio de offshores e prefere operar com dinheiro vivo. Para isso, a organização guarda dinheiro em residências (enterrando em quintais, por exemplo) ou usa casas de câmbio para transferir valores para a compra de drogas na Bolívia e no Paraguai.

Histórico - A trajetória de crescimento do PCC vem de longa data: partiu de um presídio e atravessou fronteiras. O bando que hoje domina o crime no Brasil e atua na América do Sul, Europa e África foi fundado por apenas oito presos no Anexo da Casa de Custódia de Taubaté, no Vale do Paraíba, em 31 de agosto de 1993. Idemir Carlos Ambrósio, o Sombra, foi o primeiro líder da facção.

Foi Sombra quem comandou, em fevereiro de 2001, a primeira megarrebelião de São Paulo, quando 29 presídios foram tomados simultaneamente e 16 detentos morreram. Foi assassinado cinco meses depois. Marcola assumiu o mais alto posto do PCC em novembro de 2002, de onde nunca mais saiu. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Fonte: http://noticias.band.uol.com.br/cidades/noticia/100000806455/dez-anos-apos-parar-sp-pcc-negocia-40-toneladas-de-cocaina.html

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